Resista aos aumentos!

Depois de um longo período acuado (infelizmente, pelo menos por enquanto, em se tratando de economia, pouco mais de um mês voltou a ser “um longo período”), o governo federal retomou a iniciativa da cena política. Dois fatos ocorridos na sexta-feira 26.02.98 evidenciam isso: a reunião do presidente com os governadores e a aprovação da nova diretoria do Banco Central pelo Senado.
Ao conseguir realizar uma reunião, surpreendentemente bem avaliada pelos participantes, com 26 dos 27 governadores do país, depois do tumulto provocado pela declaração de “moratória” de Minas Gerais e a criação do grupo de sete governadores de oposição, o presidente demonstra ter capacidade de articulação suficiente para encaminhar politicamente uma questão que estava se tornando explosiva. Dois motivos para otimismo: (1) os acordos de renegociação das dívidas estaduais, estopim da crise com os governadores, não serão mexidos, preservando-se o respeito aos acertos feitos; (2) o isolamento de Itamar Franco que trocou a ida à reunião pela continuação da brincadeira de “resistência”, na “trincheira” do Palácio da Liberdade em Belo Horizonte. Resta ao presidente dar conseqüência aos encaminhamentos feitos, refreando sua irresistível vocação para o privilégio do mise-en-scène político, em detrimento do árduo trabalho de persistência na articulação necessária.
No que diz respeito à aprovação prévia, após longa sabatina, pela Comissão de Assuntos Econômicos do Senado (a aprovação definitiva ainda depende da votação pelo plenário), do presidente e dos novos diretores do BC, merece destaque a tranqüilidade com que se houve Armínio Fraga. Provocado pelos senadores da oposição, reagiu com o sangue frio que se requer de um “xerife” da moeda. O principal argumento usado para atacá-lo, o de ter sido um operador de fundos do megainvestidor George Soros, foi contestado pelo ex-deputado Roberto Campos ao argumentar, em entrevista à Globonews, que os hoje talvez mais poderosos executivos econômicos públicos do mundo, o secretário do Tesouro norte-americano (Robert Rubin) e o presidente do Fed (Federal Reserve), o banco central dos EUA, (Alan Greenspan), eram, antes de assumir seus atuais cargos, respectivamente, presidente de banco de investimentos e consultor financeiro de investidores de Wall Street (a bolsa de valores de Nova York). O importante é que a nova diretoria do BC tenha competência e respeito do mercado para praticar a política monetária de que o país precisa no momento.
Estes dois eventos recentes reforçam o cenário mais provável da Estabilização Estressada da economia (ver C&T 207, disponível na Internet, no site www.tgi.com.br). Este cenário projeta um recrudescimento dos índices de inflação nos próximos meses, seguido de uma queda, acompanhada de juros decrescentes. Além disso, com a revisão do acordo com o FMI, os fluxos financeiros internacionais se restabeleceriam progressivamente, acompanhando-se uma recuperação mais ou menos vigorosa das exportações. Ao final do ano estaríamos com taxas mensais de inflação na casa de 0,5% e retomando o crescimento.
Para que esse cenário (o menos ruim dos que se esboçam) se concretize, é absolutamente imprescindível que a inflação não saia do controle. E para que a inflação não saia do controle, a indexação não pode retornar. Quatro anos e meio de inflação baixa ajudaram a desmontar os mecanismos formais e informais de indexação que realimentavam a inflação inercial. Não há nenhuma razão economicamente objetiva para que a reindexação se instale como resultado da desvalorização do real provocada pela flutuação do câmbio, mesmo que o dólar fique com a cotação acima do que, dizem os economistas, seria razoável (de R$ 1,60 a 1,70). Em tese, apenas os produtos com componentes importados (que ficam mais caros com a desvalorização) devem ter aumentos de custos e, portanto, algum repasse para os preços e isso apenas uma única vez. Atenção: tem muita gente querendo se aproveitar para tirar atrasos que não têm nada a ver com o aumento do dólar. Resista! O futuro do real e de muitos negócios geridos com responsabilidade depende disto.