Um presidente pode errar, mas não pode não saber das coisas

 
O presidente da República, a respeito da crise de energia que se abate sobre o país, declarou  publicamente na semana passada, quando a instalação da Câmara de Gestão da Crise, que “foi pego de surpresa”. Em outras palavras, disse que não sabia o que estava acontecendo. Com isso, cometeu, do ponto de vista gerencial, a declaração mais inadequada de seu período na presidência do Brasil.
Conta o folclore político (ver a respeito o número 198) que o avião em que viajava o presidente Costa e Silva sofreu uma ameaça de pane e, logo após a aterrissagem no aeroporto Santos Dumont, o chefe da segurança gritou dizendo que todos corressem porque o avião poderia explodir. Todos correram, menos  o presidente que caminhou calmamente até o saguão, chamou o chefe da segurança e disse: “o senhor cometeu dois erros. Primeiro, gritou na presença do presidente; segundo, aprenda uma coisa: presidente explode mas não corre.”
Parafraseando Costa e Silva, pode-se dizer: presidente erra mas não desconhece. Sobretudo em se tratando de uma coisa tão crucial quanto é o suprimento de energia para o país.
A pergunta imediata que vêm à mente de quem houve atônito uma declaração dessa natureza é: além disso, o que mais o presidente desconhece? Depois dessa, então, outras mais inquietantes podem surgir: Será que ele sabe dos riscos externos que o país corre? Será que ele sabe do nível de endividamento público? Será que ele tem certeza de que está cercado de auxiliares competentes e honestos? Além de muitas outras questões embaraçosas…
Assumir o erro e fazer todos os esforços possíveis para remediar o mal que está feito é muitas vezes, para quem é dirigente, muito menos danoso que  tentar se livrar da responsabilidade culpando algum auxiliar de plantão. Como bem disse um entrevistado, em meio a tantos que têm falado sobre o grave problema que afeta o país, pela rádio CBN:

“Não adianta o presidente se eximir ou tentar culpar algum assessor, nós elegemos ele, não o assessor.â€?

E é bom assumir logo, porque, seja qual for a justificativa, não dá para se eximir nem um pouco do erro monumental cometido. O racionamento de energia afetará irremediavelmente o crescimento da economia em 2001.
A crise argentina e a desaceleração da economia norte-americana, as grandes ameaças externas, se não saíssem muito fora do previsto, afetariam pouco a previsão de crescimento do PIB acima de 4% este ano. O racionamento de energia, não. Ele afeta mesmo, não só o crescimento de 2001, como pode comprometer os dos anos seguintes.
Isso, porque, além do corte físico que a produção terá que sofrer, há um aspecto de natureza psicológica talvez, até, mais grave: o corte dos investimentos. Para que a economia cresça, é preciso aumento da produção e investimentos. E investimentos só são feitos quando os investidores acreditam que haverá retorno no futuro. Se há dúvidas sobre se haverá suprimento suficiente de energia, o retorno é duvidoso.
A dimensão verdadeira do impacto que sofrerá o crescimento não se sabe ainda, mas o custo político será alto para o governo. Embora os “apagões” de energia estejam, ao que tudo indica, pelo menos por enquanto, descartados, o “apagão” do governo parece já ter começado. A 17 meses da eleição, dificilmente a deflagração antecipada da campanha poderá ser evitada. Talvez a desastrada declaração do presidente tenha sido o prenúncio de um final melancólico do seu governo.
Mas, o que consola é que o país continua vivo e se movimentando, apesar das trapalhadas dos governos. Um país que é maior que qualquer governo, ou racionamento.

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