"A voz rouca das ruas"

O Presidente Fernando Henrique gosta de expressões de efeito. Essa do título foi cunhada por ele outro dia para chamar a atenção dos críticos do governo sobre os verdadeiros sentimentos da população acerca da realidade do país. Agora, por ironia do destino, a “voz rouca” vem, pelo resultado das últimas pesquisas eleitorais, lembrar aos que já tinham como favas contadas a reeleição presidencial que, como dizem que dizia Tancredo Neves,”eleição e mineração, só depois da apuração.”
A aposta reeleitoral do governo sempre foi a de que, a despeito de tudo mais, a inflação baixa e os seus efeitos benéficos sobre a vida das pessoas seria o principal cabo eleitoral, como foi há quatro anos atrás, para a recondução de FHC por mais um período.
O recado das ruas, na conjuntura atual, alerta para outra realidade. A última pesquisa da Datafolha (publicada em 30.05.98), a primeira a apontar publicamente esta realidade depois confirmada por outros institutos, deixa claro onde está o ponto fraco da candidatura Fernando Henrique. A maioria absoluta dos brasileiros, 54%, avalia que o governo deveria dedicar aos outros problemas do país a mesma atenção que dedica ao combate à inflação. Além disso, o desemprego aparece como o principal argumento entre os eleitores que rejeitam a candidatura FHC.E, como se não bastasse, o principal motivo matemático da queda de 41% para 34% da intenção de voto em Fernando Henrique (fazendo-o virtualmente encostar em Lula com 30%) foi sua perda de apoio entre os excluídos, a camada mais pobre e numerosa da população, justamente a mais beneficiada no início do Real.
Mais claro impossível. De acordo com Elio Gaspari, em sua coluna de 03.06.98 “a queda de FFHH é produto de sua política, a ascensão de Lula nada tem a ver com suas virtudes.”
Essa política é que é o problema. Delfim Netto em entrevista à revista Isto É Dinheiro de 20.05.98, ilustra bem: “A estabilização é uma condição fundamental, mas você só fez um pedacinho da coisa, faltou todo resto (…) Aos poucos, por causa da violência, da insegurança, do desemprego, do mal-estar produzido por um crescimento lento, os problemas vêm emergindo (…) É impossível ignorar o fato de que o juro alto, que produziu essa acumulação fantástica de reservas, é simplesmente o outro lado do desemprego. O que produziu o aumento das reservas é o mesmo fenômeno que produziu o desemprego.”
Esperemos, mais uma vez, que esse susto sirva de lição para o governo e dê tempo para que reorientações nesta política sejam feitas de modo conseqüente. Competência não falta, o que tem sobrado é soberba. E soberba é ruim em qualquer situação. Do ponto de vista estratégico, “o pior erro é subestimar o inimigo” (ver a respeito Conjuntura & Tendências nº 57).
No mais, é preciso ter paciência porque eleição é assim mesmo, emoções a cada instante. Atribui-se a Magalhães Pinto, mineiro como Tancredo, a seguinte definição da política: “é como nuvem. A gente olha e está de um jeito, logo depois olha de novo e já está de outro.”
O próprio Lula, depois dos últimos resultados, já disse: “falta ainda muita água passar pela ponte.”

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