As lições da derrota

“Toda grande vitória é anterior a si mesma. Toda grande derrota, também.”

Nelson Rodrigues

Depois de passado o impacto inicial, a única constatação possível é de que foi grande a derrota que a seleção brasileira sofreu para a seleção da França na disputa do Campeonato Mundial de Futebol 1998. O Brasil foi goleado (3×0) por um time sem ataque. Um time simples mas que jogou com entrosamento, garra e tática. Tudo que se espera de uma equipe numa disputa, sobretudo se não dispõe de grandes talentos individuais ou, principalmente, por causa disso.
O time francês, mesmo com um a menos, deu um verdadeiro nó no previsível esquema de jogo do time brasileiro. O técnico da França, depois de estudar cuidadosamente o adversário, chegou a antecipar que impediria o jogo do principal talento do Brasil (Ronaldinho, de fato um craque incomum) marcando severamente os jogadores que passariam a bola para ele (Rivaldo, Bebeto, Roberto Carlos e Cafu). Dito e feito, sem bola e sem preparo físico nem psicológico, Ronaldinho nada pode fazer em campo. Isto, aliado às repetidas falhas primárias de uma defesa que permitiria dois inacreditáveis gols de cabeça na cobrança de escanteios, resultou na humilhação que, sem querer acreditar, todos passamos.
Assim como a vitória tem o dom de encobrir os erros, a derrota tem o de deixá-los expostos. O principal deles foi, sem dúvida, a falta de unidade de um time cujos sucessos diante de adversários fracos e a sorte diante da Holanda fizeram esquecer.

“A seleção brasileira é um conjunto de jogadores, não é uma equipe.”

Armando Nogueira, no programa Apito Final, Rede Bandeirantes, 12.07.98

Os sinais de desentrosamento e falta de comando (duas faces da mesma moeda gerencial) apareciam desde a fase preparatória e chegaram a explodir dentro de campo com a briga entre Bebeto e Dunga, apesar do técnico Zagallo repetir diversas vezes que “tinha o time na mão.” A realidade mostrou que não só não tinha o time como nem mesmo os jogadores, uma evidência que a pieguice das mãos dadas ao entrar em campo (“coreografia para enganar trouxa”, segundo Armando Nogueira), apenas tornava mais incômoda.

Além desses dois erros graves (desentrosamento e falta de comando) mais outros quatro podem ser relacionados.

Mau Exemplo do Técnico: “um fraco rei faz fraca a sua forte gente.” Um gerente arrogante, teimoso e emocionalmente instável é tudo o que um grupo precisa para ficar à “beira de um ataque de nervos” e repetir, sincronicamente, o exemplo ruim que observa todo dia.
Previsibilidade de Esquema de Jogo: decorrente da teimosia. Insistir num esquema sofrível, sem nenhuma alternativa de fazer algo diferente é abrir mão do fator surpresa, o único capaz de por em risco a segurança do adversário.
Excesso de Dependência do Talento Individual: nenhuma equipe está segura se depende demais do talento individual, por mais excepcional que ele seja. Além de reforçar a previsibilidade e tornar fácil a estratégia do adversário, fica refém da fatalidade. Se o talento tiver uma dor de barriga, o mundo desaba.
“Já Ganhou!”: o erro mais elementar e mais danoso numa disputa é subestimar o adversário. Sobretudo se a subestimação vem do líder. Na vida real, aquele que acredita que já ganhou antes do jogo começar é sério candidato à derrota inesperada.
Os erros verificados na seleção são muito comuns de encontrar no funcionamento das equipes de trabalho nas empresas. Resta-nos o consolo de que a sua observação nos ajude a melhorar o desempenho dos nossos times empresariais nas batalhas do dia-a-dia, tão duras quanto a do Stade de France em Saint-Denis, mas com resultados que podem ser diferentes se houver humildade para reconhecer e sabedoria para corrigir a tempo. O que, infelizmente, faltou, para tristeza geral, ao time canarinho (a “pátria em calção e chuteiras”, como falava Nelson Rodrigues). Vamos aprender com a derrota!

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