Criatividade só funcionaquando há muita realização

 
Nos números 321 e 322 o Gestão Hoje tratou do importante tema da inovação empresarial mas deixou de fora um outro muito citado na literatura e na mídia, especializada ou não, que é a criatividade (já tratado separadamente nos números 260 e 264). Há uma clara conexão entre esses dois assuntos e é imprescindível tratar dela para dar maior completude à abordagem iniciada.
Criatividade é, hoje, de certa forma, um tema da moda, sobretudo depois que o sociólogo italiano Domenico De Masi passou a tratar dele na esteira dos seus livros e palestras de sucesso sobre o “ócio criativo” e o ” fim do trabalho”.

“…criatividade é o oposto de burocracia, porque é a fantasia aliada à realização. Realização sem fantasia gera burocratas. Portanto, burocracia e criatividade são opostos.”

Domenico De Masi, revista Você SA, março/99

Não é o caso de comentar nesse espaço a teoria de De Masi (o que, por certo, demandará, no futuro, no mínimo, um número exclusivo do Gestão Hoje), mas, apenas, destacar o papel relevante que reserva à criatividade na sociedade do futuro, em contraposição à burocracia, à mesmice e, em última análise, ao aniquilamento da organização e daqueles que nela trabalham. Apesar desse destaque preponderante, todavia, o próprio De Masi alerta para a necessidade de se dar conseqüência à criatividade.

“A criatividade resulta de fantasia e realização. Acontece que é difícil encontrar alguém muito fantasioso, criativo e efetivo ao mesmo tempo.”

Domenico De Masi, idem

Daí, a importância de estimular à criatividade, tanto individual quanto dos grupos, aliando-a à efetividade e ao aproveitamento que se transforme, de fato, em inovação empresarial relevante. “Sair do aquário” é fundamental, criar e inventar, essenciais, mas transformar em matéria aproveitável a idéia criativa é uma obrigação.
Esse alerta é importante porque se, por um lado, já é difícil libertar-se da tirania do dia-a-dia e criar oportunidades de “escape” da rotina para dar chance ao insigth criativo, por outro, a apologia descabida da criatividade como um remédio para toda mesmice do mundo, pode levar ao entendimento de que basta sair por aí metralhando a rotina com idéias “geniais” para garantir a inovação e a sobrevivência da empresa burocrática.
A coisa não é por aí. É preciso cuidado para que a criatividade não vire sinônimo de irresponsabilidade e não se banalize. Larry Allison, fundador e presidente da Oracle, uma das maiores fortunas do mundo, rival de Bill Gates da Microsoft, trata a questão de um modo tão direto que chega a ser rude.

“Quer ser criativo? Escreva um romance. As empresas não precisam de criatividade. Precisam de inovação (…) Inove ou morra. (…) Esse é o nosso lema.”

Larry Allison, revista Veja, 18.10.2000

Não resta dúvida que a criatividade é uma espécie de “mãe” da inovação. Necessária, prestativa, até severa, se necessário. Nunca excessiva, benevolente demais, descuidada, irresponsável. A inovação, depois de um determinado tempo, tem que “ser colocada no mundo” e andar com suas própria pernas. Excesso sem conseqüência prejudica tanto quanto a falta.
Afinal, como já se disse por aí, uma coisa bem feita, requer “1% de inspiração e 99% de transpiração“. Talvez seja essa a dosagem aproximada do remédio de De Masi: uma dose de fantasia misturada com uma grande dose de realização.